Mateus de Lacerda Silvério
1.INTRODUÇÃO
No atual cenário mundial o concreto é o segundo material mais consumido, ficando atrás somente da água, devido ao seu uso intenso na construção civil. Como consequência dos elevados impactos ambientais, decorrentes sobretudo da produção do cimento Portland, há diversos estudos na temática do concreto armado para a descoberta de novos materiais que possam ofertar–lhe maior resistência, durabilidade e para ser mais sustentável. Sabe-se que o concreto, por si só, tende a adquirir resistência com o passar do tempo, no entanto no método construtivo de concreto armado, o aço tende a sofrer com processos oxidativos, afetando a capacidade resistiva do material e consequentemente da estrutura. Isto se deve a processos como a carbonatação, ataque de cloretos e, em obras que estão em contato com a água que levam a corrosão do aço, pode haver o desplacamento do concreto de cobrimento, expondo as armaduras em contato direto com ambientes agressivos acarretando a rápida deterioração do metal (MAZZÚ A.D.E.,2020).
Neste contexto, os Polímeros Reforçados com Fibras (PRF), no idioma inglês Fiber Reforced Polymers (FRP), surgem como alternativa de substituição do aço, já que possuem alta resistência mecânica e a agentes ambientais agressivos, além de serem ótimos isolantes térmicos e elétricos, com um peso específico menor. Dentre todas as fibras que podem ser utilizadas, a mais recomendada é a de vidro, tendo em vista o seu satisfatório custo-benefício, podendo ser inserida na matriz cimentícia de diferentes formas. Dentre as diversas possibilidades, têm-se a utilização das barras do tipo GFRP (Glass Fiber Reforced Polymers), ilustradas nas Figuras 2 e 3, na forma de vergalhões de fibra de vidro (PRFV – Polímeros Reforçados por Fibras de Vidro), para a substituição das barras de aço no concreto armado.
2. POLÍMEROS REFORÇADOS POR FIBRAS (FRP)
Segundo Cateb L.C. et al. (2011), os polímeros reforçados com fibras (PRF) podem ser a melhor solução para o emprego no concreto armado, tendo em vista suas diversas maneiras de aplicações, além de ser um material com alta resistência mecânica, ou seja, pode ser utilizado na mesma função do aço, que é resistir aos esforços de tração, além da baixa deterioração quando expostos a ambientes agressivos. De acordo com a norma americana (ACI 440.1R-2015), polímeros reforçados com fibras são compósitos feitos de fibras mergulhadas em uma matriz de resina polimérica utilizadas para reforço em estruturas de concreto, sendo a fibra de vidro (GRFP) a mais indicada para ser utilizada, por possuir maior facilidade de ser obtida e um custo menor. A Tabela 1 traz todas as fibras e suas respectivas possibilidades de uso.
Tabela 1: Tipos de GRFP e suas aplicações
| Tipos de fibra | Principal aplicação |
| E | Aplicação usuais, baixo conteúdo de álcalis (<1%) |
| A | Elevado conteúdo de álcalis (10-15%) |
| C | Excelente resistência a corrosão, utilizada para acabamento de superfícies |
| E-CR | Livre de boro, boa resistência a corrosão por ácidos |
| R, S | Excelentes propriedades mecânicas, utilizadas para aplicações de alto desempenho |
| AR | Álcali resistente, empregada em concretos reforçados com fibras |
Fonte: Adaptado de Beber (2003)
3. BARRAS DE FIBRAS DE VIDRO (GFRP)
No processo de fabricação dos vergalhões de GRFP, pode ser utilizada qualquer uma das fibras citadas na Tabela 1, no entanto em obras em áreas industriais, costeiras, barragens, comportas e instalações de geração de energia é indicada a utilização da fibra álcali resistente (AR), por fornecer maior durabilidade a essas estruturas em ambientes agressivos. O processo de obtenção das barras é chamado de Pultrusão, conforme Figura 1, realizado a uma velocidade de 0,9 m/min e consiste no banho dos filamentos fibrosos com uma resina (termofixa epóxi éster vinílica – polímero), catalisador e aditivos. Cada fibra recebe um revestimento químico (sizing) para aumentar ainda mais a resistência a abrasão do perfil pultrudado (ANDRADE E.D.L,2022).
Atualmente, os principais fabricantes deste tipo de material indicam que os diâmetros comercialmente produzidos para as barras (Figura 2) são 6, 10, 12,5, 16, 25 e 32 mm, com comprimento de 6, 9, 12 ou 15 m, podendo ser obtidas em tamanhos maiores caso seja necessário. Além do formato de vergalhões, as telas POP (Figura 3) podem ser outra possibilidade de fornecimento, com as malhas nos padrões de 10×10 cm, 15×15 cm, 20×20 cm, ou em dimensões a depender do projeto.
Figura 1: Diagrama esquemático do processo de pultrusão
Fonte: Stratus (2023)
Figura 2: Aplicação dos vergalhões GRFP em estruturas.
Fonte: Stratus (2024)
Figura 3: Aplicação das malhas POP de GRFP
Fonte: Stratus (2024)
4. PONTOS POSITIVOS
Com base em diversos estudos realizados na área, nota-se que a utilização de barras de GRFP em substituição ao aço no concreto armado possui algumas vantagens, como: alta resistência à tração, possuindo um comportamento elástico até a sua ruptura abrupta. As tensões de ruptura equivalem a aproximadamente 30% da sua resistência última para que seja evitado problemas com ruptura por fluência, de acordo com o ACI 440.2R-02 (2002).
Os GRFPS possuem excelente resistência à fadiga, além de serem pouco corrosivos, porém os ataques químicos ainda assim podem afetar sua durabilidade. No entanto, a estimativa é de que estruturas de concreto armado utilizando os vergalhões de fibra de vidro durem 100 anos enquanto com aço AC-50 somente 50 anos. Sendo assim, mesmo com uma boa resistência, deve-se levar em consideração um fator ambiental de redução (Ce) de 0,8 ou 0,7 para projetar as armaduras com este material, de acordo com o ambiente em que ele será exposto (Cateb, L.C. et al., 2011).
Outra vantagem em relação ao aço é que estas barras são de fácil manuseio e são bem mais leves, podendo diminuir o peso de obras de grande porte sem que esta perca sua resistência. Outrossim, os vergalhões também não são condutores elétricos, não magnetizáveis e possuem baixa condutibilidade térmica, assim surgem como uma ótima opção para construções que necessitem de conforto térmico ou em casos específicos para resistirem a altas temperaturas desde que não ultrapasse a temperatura de transição vítrea, já que nesta fase as barras perdem algumas de suas propriedades, ocorrendo uma transição elasto-plástica, como mostrado na tabela 2, na qual está uma breve comparação das principais característica de ambos materiais. (Witt, 2009).
Tabela 2: Tabela comparativa dos vergalhões
| Propriedade | Aço CA-60 | GRFP |
| Tensão de Ruptura (MPA) | 630 | 1180 |
| Alongamento total (º/oo) | 30 | 26,1 |
| Módulo de elasticidade E (GPA) | 200 | 64 |
| Aderência (MPA) | 13,7 | 12,2 |
| Cobrimento de concreto(mm) | 30 a 60 | 10 |
| Densidade(g/cm³) | 7,85 | 2,2 |
| Condutividade Térmica (W/mK) | 60 | <0,5 |
| Coef. De Expansão Térmica (1/K) | 0,8 a 1,2×10-5 | Axial 0,6×10-5 Radial 2,2×10-5 |
| Susceptibilidade ao magnetismo | sim | Não |
| Condutor eletromagnético | sim | Não |
Fonte: Adaptado de Witt (2009).
5. PONTOS NEGATIVOS
Assim como qualquer material, as barras de fibra de vidro também possuem alguns pontos negativos a serem ressaltados. Na Tabela 2 observa-se que os vergalhões de GRFP possuem um modulo de elasticidade baixo comparado ao aço, acarretando deslocamentos maiores para uma mesma força. Além disso, não possuem uma boa resistência a tensões de compressão e cisalhamento comparado a seu ótimo desempenho à tração.
Outrossim, a substituição do aço por este material no Brasil torna-se difícil, pelo fato de que a utilização de armaduras na construção civil já está muito difundida, por ser de mais fácil obtenção no mercado atual e não requerer mão de obra especializada, o que não acontece para os vergalhões de GRFP, já que não podem ser dobrados em canteiro de obras e requerem cuidado maior e como qualquer novidade na construção civil, leva-se um tempo até que esta tecnologia possua uma maior adesão entre os fabricantes e construtores.
Nesse sentido, os fatores citados acima interferem também no custo deste material, como pode ser observado na tabela 3, a qual mostra que na atualidade o Aço CA-50 encontra-se mais barato que as barras de GRFP. No entanto, isto se deve ao fato de ser uma tecnologia recente que com o passar do tempo, havendo uma maior adesão e demanda do material no mercado da construção civil, além de avanços em pesquisas para diminuir o custo de produção, o preço das barras de fibra de vidro tendem a ser menor, tornando-se mais competitivo com o Aço.
Tabela 3: Custo dos Vergalhões
| Material | Diâmetro (mm) | Custo por metro |
| Aço CA-50 | 6,3 10 12,5 20 25 | R$ 1,86 R$ 4,43 R$ 5,99 R$ 17,68 R$ 27,63 |
| GRFP | 6 10 13 20 25 | R$ 2,98 R$ 7,00 R$ 10,45 R$ 25,29 – |
Fonte: Adaptado de SINAPI (dez./2023) e Meu Compressor (2024).
Por último, um dos fatos mais importantes, o Brasil ainda não possui normas que regulamentem o uso de fibras na construção civil, diferentemente de países como Estados Unidos e França, que possuem sua própria norma, auxiliando no dimensionamento e uso deste material.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do que foi apresentado acerca das barras de GRFP, nota-se que este material tem algumas características que se alinham com as exigências da sustentabilidade, constituindo-se em uma solução para o problema do concreto armado e a oxidação de suas armaduras, tendo em vista que as fibras de vidro possuem alta resistência mecânica e são indicadas para uso em ambientes agressivos ou estruturas de grande porte que necessitem diminuir seu peso. Vale ressaltar que as barras de GRFP podem ser utilizadas em conjunto com as de aço, como reforço em ambientes sujeitos à corrosão, tudo isso com um custo relativamente próximo. No entanto, para que isso ocorra, estudos mais aprofundados devem ser realizados para que uma norma brasileira seja elaborada sobre o uso destas fibras mais especificamente em relação aos vergalhões de fibra de vidro, buscando analisar sua viabilidade e segurança do projeto que utilize esse material.
REFERÊNCIAS
AMERICAN CONCRETE INSTITUTE. Guide For The Design And Construction Of Structural Concrete Reinforced With Frp Bars (ACI 440.1R-2015). Nova York, EUA, 2015.
ACI 440.2R-02. Guide for the Design and Construction of Externally Bonded FRP Systems for Strengthening Concrete Structures. Farmington Hills, MI, 2002.
ANDRADE, E.D.L. Estudo sobre a substituição de armadura metálica por barras de fibra de vidro em seções de vigas de concreto armado submetidas à flexão. 2022.54p. Monografia (Trabalho de Conclusão de Curso em engenharia civil) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal,2022.
BEBER, A.J. Comportamento estrutural de vigas de concreto armado reforçadas com compósitos de fibra de carbono. 289p. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.
CATEB, L.C. et al. Concreto com armadura de fibra de vidro. 2011.31p. Monografia (Especialização em construção civil) – Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo horizonte,2011.
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da
Construção Civil – SINAPI – Referência de Preços e Custos, Paraná. Disponível em: www.caixa.gov.br/site/Paginas/downloads.aspx. Acesso em: 06 de março de 2024.
DE SOUZA, B.V. et al. VANTAGENS E DESVANTAGENS DA UTILIZAÇÃO DA FIBRA DE VIDRO NO CONCRETO ARMADO: UMA REVISAO BIBLIOGRAFICA. Revista Multidisciplinar do Nordeste Mineiro, v. 11, n. 1, 2023. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/374287377_VANTAGENS_E_DESVANTAGENS_DA_UTILIZACAO_DA_FIBRA_DE_VIDRO_NO_CONCRETO_ARMADO_UMA_REVISAO_BIBLIOGRAFICA. Acesso em: 03 nov. 2023.
MAZZÚ, A.D.E. Estudo sobre a substituição de armadura metálica por barras de GFRP em vigas de concreto armadas à flexão quando submetidas ao ataque acelerado de íons cloreto. 2020. 190p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2020.
MICALI, R.M. Análise teórica de vigas pré-moldadas de concreto com armadura de aço e de polímero reforçado com fibra de vidro em meio altamente agressivo. 2010. Dissertação (Tese de Doutorado) – Universidade de São Paulo, São Carlos,2010.
STRATUS. Stratus FRP, 2024. Processo de Pultrusão. Disponível em: Vergalhão em fibra de vidro para construção civil – Stratus (stratusfrp.com). Acesso em: 04 de nov. de 2023.
MEU COMPRESSOR. Vergalhão de fibra de vidro GFRP barra 12mts Topfiber. Disponível em: Vergalhão de 12m de Fibra de Vidro GFRP da Topfiber: Durabilidade e Resistência Juntas! | Loja MeuCompressor. Acesso em: 07 de março de 2024.
WITT, C. FIBER REINFORED COMPOSITE. (2009). Toronto: University of Toronto.



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