Barragem de rejeitos
Para entender as informações que chegam sobre o rompimento das barragens de rejeitos da Samarco no dia 5 de novembro e suas consequências, é preciso conhecer alguns conceitos e definições que estão sendo divulgados e não explicados. Obtido esse conhecimento, poderemos entender o contexto da tragédia e ter noção do grande problema ambiental e social que terá consequências mundiais, em especial no quesito segurança.
O que é uma barragem de rejeitos?
Uma barragem de rejeitos é uma estrutura de terra construída para armazenar resíduos de mineração, os quais são definidos como a fração estéril produzida pelo beneficiamento de minérios em um processo mecânico e/ou químico, que divide o mineral bruto em concentrado e rejeito. O rejeito é um material que não possui maior valor econômico, mas para salvaguardas ambientais deve ser devidamente armazenado. As características dos rejeitos variam de acordo com o tipo de mineral e de seu tratamento em planta (beneficiamento). Podem ser finos, compostos de siltes e argilas, depositados sob forma de lama, ou formados por materiais não plásticos, (areias) que apresentam granulometria mais grossa e são denominados rejeitos granulares (Espósito, 2000). Os rejeitos granulares são altamente permeáveis e contam com uma boa resistência ao cisalhamento, enquanto os rejeitos de granulometria fina, abaixo de 0.074mm (lamas), apresentam alta plasticidade, alta compressibilidade e são de difícil sedimentação.
Quais são os métodos construtivos?
Muitas vezes em uma mineração é necessário aumentar a capacidade de armazenamento de uma barragem de rejeito existente, através da construção de alteamentos, de acordo com os seguintes métodos construtivos: método à montante, método à jusante e método da linha de centro.
Método à montante
O método à montante, em sua etapa inicial, consiste na construção de um dique de partida, formado geralmente de materiais argilosos ou enrocamento compactado. Após esta etapa, os rejeitos são depositados hidraulicamente da crista do dique de partida, formando uma praia de rejeito que, com o tempo, adensará e servirá de fundação para futuros diques de alteamento, estes executados com o próprio material de rejeito. O processo é repetido até atingir à cota de ampliação prevista.
Se, por um lado, o método à montante apresenta como vantagens a simplicidade e o baixo custo de construção, por outro está associado à maioria das 31 rupturas em barragens de rejeitos em todo o mundo (Engels & Dixon-Hardy, 2008). Rupturas por percolação e erosão (piping) também são possíveis quando a distância entre o lago de decantação e o talude de jusante da barragem não for suficientemente grande, propiciando a ocorrência de gradientes hidráulicos elevados.
A melhor forma de diminuir este risco é ter uma vasta praia entre a crista da barragem e o reservatório (Gomes, 2010), além de contar com um sistema de drenagem interno eficiente para abatimento da superfície freática (Icold & Unep, 2001; Gomes, 2010). Excessos na velocidade do alteamento pode também induzir o mecanismo de liquefação estática.
Para zonas de alta atividade sísmica, não é recomendado o alteamento de barragem de rejeito pelo método à montante pois aumenta significativamente a probabilidade de liquefação dinâmica induzida por terremotos.
Método à jusante
É um método mais conservador do que o método à montante, desenvolvido para reduzir os riscos de liquefação em zonas de atividade sísmica. Depois da construção do dique de partida, os alteamentos subsequentes são realizados à jusante do mesmo, até atingir a cota de projeto.
Neste processo construtivo, cada alteamento é estruturalmente independente da disposição do rejeito, melhorando assim a estabilidade da estrutura. Todo o alteamento da barragem pode ser construído com o mesmo material do dique de partida, assim como os sistemas de drenagem internos podem ser também instalados durante o alteamento, permitindo um melhor controle da superfície freática.
A principal desvantagem desde método é o custo de sua implantação, devido ao grande volume de aterro que necessita e a grande área que sua construção ocupa.
Método da linha de centro
Este método é uma solução intermediária entre os dois métodos apresentados anteriormente. Isso porque possui uma estabilidade maior que a barragem alteada somente com o método à montante, contudo não requer um volume de materiais tão significativo como no alteamento somente com o método à jusante. O sistema de disposição é similar ao método à montante, com rejeitos lançados a partir da crista do dique de partida. A construção prossegue de modo similar, com alteamentos com diques sucessivos, porém permanecendo o eixo de simetria da barragem constante.
Se a parte superior do talude perder eventualmente o confinamento, podem aparecer fissuras, causando problemas de erosão e aumentos de poropressões. (Troncoso, 1997).
A tabela a seguir compara as principais vantagens entre estes métodos de alteamento de barragens de rejeitos.
Quais os impactos de uma barragem de rejeitos?
Barragens de rejeitos são estruturas que têm a finalidade de reter os resíduos sólidos e água dos processos de beneficiamento de minério. O engenheiro Fernando Arturo Erazo Lozano, em dissertação apresentada à USP, analisa sobre a Seleção de Locais para Barragens de Rejeitos Usando o Método de Análise Hierárquica. O autor explica que o planejamento inicia com a procura do local para implantação, etapa na qual se deve vincular todo tipo de variáveis que direta ou indiretamente influenciam a obra: características geológicas, hidrológicas, topográficas, geotécnicas, ambientais, sociais, avaliação de riscos, entre outras.
Nos processos de beneficiamento, a quantidade gerada de rejeitos é muito alta e a disposição é feita, dependendo dos objetivos econômicos da mineradora, em superfície, ou vinculada ao processo de extração do minério de forma subterrânea ou a céu aberto. Fernando Lozano afirma que existem dois tipos de resíduos produzidos pelas atividades mineradoras:os estéreis e os rejeitos. “Os estéreis são dispostos, geralmente, em pilhas e utilizados algumas vezes no próprio sistema de extração do minério. Os rejeitos são resultantes do processo de beneficiamento do minério, contem elevado grau de toxicidade, além de partículas dissolvidas e em suspensão, metais pesados e reagentes”.
Nas estruturas da construção de uma barragem de rejeitos é importante a escolha da localização até o fechamento, que deve seguir as normas ambientais e os critérios econômicos, geotécnicos, estruturais, sociais e de segurança e risco. “O planejamento e o projeto da barragem de rejeitos devem incluir programas de ensaio em campo e em laboratório das fundações, rochas e materiais de empréstimo, para avaliar suas propriedades físicas e mecânicas, além das características das águas subterrâneas, sua localização e composição”, diz Fernando Lozano.
Empresas mineradoras possuem variáveis consideradas para determinar a melhor opção de local que se limitam às economias. Fernando Lozano afirma que “as novas legislações ambientais, obrigam os mineradores a considerar também as variáveis ambientais, as estruturas, as geológicas e até os impactos que os rejeitos gerarão nas comunidades circunvizinhas”.
Quem fiscaliza uma barragem de rejeitos?
No caso de Minas Gerais, o órgão competente é a Secretaria de estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
A Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) é um dos órgãos seccionais de apoio do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) e atua vinculado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).
Rompimento de barreira – estudo simulado
https://www.youtube.com/watch?v=q5onQF1G3DU
Fontes:
http://organicsnewsbrasil.com.br/meio-ambiente/o-que-e-barragem-de-rejeitos/
http://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/20720/20720_3.PDF
DESASTRE EM MARIANA
O rompimento da barragem de Fundão, dia 5 de novembro, na unidade industrial de Germano, entre os distritos de Mariana e Ouro Preto (cerca de 100 km de Belo Horizonte), provocou uma onda de lama que devastou distritos próximos. O mais atingido foi Bento Rodrigues.
As causas ainda estão sendo investigadas. A Samarco informou ter registrado dois pequenos tremores na área duas horas antes do rompimento, o que foi confirmado pelo Observatório Sismológico da Universidade de Brasília. Contudo, ainda está em discussão se esse é um evento natural ou desencadeado pelos reservatórios, já que não chovia no momento do rompimento. Um engenheiro da Samarco afirmou que uma vistoria não detectou risco no local. Mas um laudo obtido pelo Jornal da Globo mostra que já se sabia do risco. “O contato entre a pilha de rejeitos e a barragem não é recomendado por causa do risco de desestabilização do maciço da pilha e da potencialização de processos erosivos”, diz o documento. Para o Ministério Público, isso mostra que houve “negligência” da empresa. A Feam (Fundação Estadual de Meio Ambiente) declarou que chegou a recomendar a necessidade de se fazer reparos na estrutura da barragem de Fundão.
O distrito de Bento Rodrigues foi destruído e centenas de pessoas ficaram desabrigadas. A lama alcançou outros distritos de Mariana, como Águas Claras, Ponte do Gama, Paracatu e Pedras, além da cidade de Barra Longa. Os rejeitos foram levados pelo Rio Doce, afetando ainda dezenas de cidades na Região Leste de Minas Gerais até o Espírito Santo, com a falta de água potável.
A onda de lama continua a atingir outras comunidades, como Paracatu de Baixo e Camargos, e as cidades de Barra Longa, Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado e cidades do Leste de Minas, como Governador Valadares. A lama também chegou ao Espírito Santo, levada pelo Rio Doce, afetando Regência, Linhares, Baixo Gandu e Colatina.
No local onde opera a Samarco, ainda existe a barragem de Germano, a maior entre as três que compunham o sistema de rejeitos. Em razão do risco de rompimento também dessa barragem, as buscas foram replanejadas por medida de segurança. O Corpo de Bombeiros divulgou a existência de uma trinca nessa barragem. A barragem de Santarém ainda armazena rejeito, é monitorada e vai passar por intervenções preventivas. A Samarco informou que iria realizar intervenções nas “estruturas remanescentes das áreas de barragens” para proporcionar mais estabilidade e prevenir “problemas futuros”.
Segundo o geólogo Luiz Paniago Neves, coordenador de fiscalização de pesquisa mineral do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), órgão responsável pela fiscalização de barragens de rejeitos, o rejeito de minério de ferro é classificado como inerte, ou seja, inofensivo. Se ele chegar ao leito de um rio, por exemplo, a água poderá ficar turva, ocorrerá uma sedimentação, mas o consumo da água não terá impacto na saúde. Apesar disso, ainda não houve nenhuma análise específica dos rejeitos despejados pelas barragens. Em Governador Valadares, uma das cidades banhadas pelo Rio Doce, o diretor geral do serviço autônomo de água e esgoto, Omir Quintino, disse que a água coletada para análise apresentou alto índice de ferro, o que inviabiliza o tratamento, além de grande quantidade de mercúrio, que é muito tóxico. Já a Samarco diz que não havia elementos tóxicos no material.
Segundo o Ibama, estima-se o lançamento de 50 milhões de metros cúbicos de rejeito de mineração, o suficiente para encher 20 mil piscinas olímpicas, composto principalmente por óxido de ferro e sílica (areia)
A coordenadora do núcleo de emergências do Ibama de Minas Gerais, Ubaldina da Costa Isaac relatou que a lama atingiu uma extensão de 80 km do leito d’água na região. Uma das consequências é o assoreamento, ou seja, o acúmulo de sedimentos na calha do rio, causando impactos socioeconômicos e ambientais.
Conforme o Ibama, houve alterações nos padrões de qualidade da água (turbidez, sólidos em suspensão e teor de ferro). Um dos impactos é a mortandade de animais, terrestres e aquáticos, por asfixia. Já no Rio Doce, onde chega mais diluída, a morte de peixes ocorre pelo sistema respiratório, complementa o instituto.
O prefeito de Mariana, Duarte Júnior, disse que o prejuízo com o rompimento é de ao menos R$ 100 milhões, incluindo perdas de infraestrutura, dano ambiental, pontes levadas e escolas que foram destruídas. O número é um levantamento preliminar feito pela Secretaria de Obras da cidade
Segundo o Departamento Nacional de Produção Mineral, a barragem de Fundão está classificada como de baixo risco, pelo bom monitoramento e documentação em dia. Mas por estar situada em região com alta densidade populacional, sua classificação do dano potencial associado, ou seja, da gravidade do que poderia acontecer em caso de acidente, é alto.
Como exercem uma atividade de risco, as mineradoras devem seguir normas técnicas de segurança e estão sujeitas à legislação ambiental e licenciamento ambiental. Uma das obrigações é ter um plano de recuperação de áreas degradadas pela atividade.
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